Pular para o conteúdo principal

Por um projeto de país, depois das cinzas



Os últimos cem dias têm mostrado que os piores prenúncios podem se cumprir com grande facilidade, dadas as condições institucionais do país. Em meu último post, de fim de Outubro/18, comentei “Geralmente consertar os erros é um ato amargo assim como entrar na tarefa obscura de descobrir o que vem pela frente.” 

Pois bem, as duas questões, consertar os erros e descobrir o que vem pela frente, estão na pauta do dia, a cem dias. Os poderes, constituídos para equilibrarem um ao outro, penderam e adernaram, e agora brigam para se sobressair diante de um beco sem-saída inexorável. 

Assistimos ao desmonte sistemático de vários equipamentos, serviços e de representatividades, sem que a sociedade consiga se manifestar com força, potencializando dia-a-dia o poder destrutivo que se tornou a máquina pública de governar. A cultura, a pluralidade, a segurança institucional e jurídica, que servem para sustentar uma nação, estão por um fio.

Assistimos, ao redor do mundo, e há décadas, a guerras, devastações, genocídios. A disputa pelo poder e pela imposição de ideologias provou-se a mais devastadora arma de destruição. Estamos à mercê de algo semelhante, mas endógeno. Não há guerra, não há inimigo, não há sinais de “destruição do país”... ainda. Declarações de pessoas sérias, comprometidas, isentas, nos levam a pensar que aquilo que achávamos terrível do ponto de vista da governabilidade, prova-se na verdade um mecanismo de autodestruição configurado para minar todos os avanços que nossa sociedade conseguiu ao logo do último século! Retrocedemos rápida e inexoravelmente.

Cabe refletir, agora, sobre o que fazer. Tentar frear esta máquina significa subverter a ordem. Podemos tentar um plebiscito... mas minha reflexão sempre tende para o depois do fim. Algo como reconstruir das cinzas, do zero. Lembro do poema que ouvi (e encenei) a anos, e que martela minha memória diariamente...

Grafitti - Anônimo
Primeiro levaram os negros 

Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso 
Eu não era negro 
Em seguida levaram alguns operários 
Mas não me importei com isso 
Eu também não era operário 
Depois prenderam os miseráveis 
Mas não me importei com isso 
Porque eu não sou miserável 
Depois agarraram uns desempregados 
Mas como tenho meu emprego 
Também não me importei 
Agora estão me levando 
Mas já é tarde. 
Como eu não me importei com ninguém 
Ninguém se importa comigo.

Bertolt Brecht (1898-1956)


Comentários

Siga nossa página